segunda-feira, 7 de agosto de 2023

Não, São Paulo não me cativou nesse ano.

Para mim, privilégio não é estar onde “todo mundo está”, mas estar em um lugar onde se pode, num giro de 360º, não se deparar com ninguém, só com a natureza – obra de Deus.

Gosto mesmo é dos ermos, das paragens do vento, do sol que salpica de prana a atmosfera.

De longas caminhadas em estradas de terra, do silêncio.

Vapor d´água, mata verde, horizonte livre.

sábado, 10 de dezembro de 2022

Ontologias do outro, outras epistemologias: decolonialidade e princípio pluralista


 


O desafio epistemológico que se apresenta ao cientista da religião nos dias de hoje, diz respeito ao desenvolvimento e aperfeiçoamento de recursos teórico- metodológicos capazes de lidar com o problema da alteridade do outro diante do fenômeno religioso.

Com a emergência do paradigma decolonial, as ciências da religião assumem o compromisso de destinar atenção às configurações religiosas, sociopolíticas, econômicas, culturais e epistêmicas estabelecidas em espaços fronteiriços. Reconhecendo e validando a diversidade de denominações presentes no campo religioso, através da adoção do princípio pluralista, tido como,

[...] um instrumento hermenêutico de mediação teológica e analítica da realidade sociocultural e religiosa que procura dar visibilidade a experiências, grupos e posicionamentos que são gerados nos “entrelugares”, bordas e
fronteiras das culturas e das esferas de institucionalidades. Ele possibilita divergências e convergências novas, outros pontos de vistas, perspectivas críticas e autocríticas para diálogo, empoderamento de grupos e de visões subalternas e formas de alteridade e de inclusão, considerados e explicitados os diferenciais de poder presentes na sociedade. Nossa pressuposição é que o princípio pluralista formulado a partir de lógicas ecumênicas e de alteridade, possibilita melhor compreensão do quadro religioso e também das ações humanas.  (RIBEIRO, 2017, p. 241)

 

Segundo Claudio de Oliveira Ribeiro, os desafios que se insinuam para os cientistas da religião a partir do aparelhamento epistemológico com paradigma decolonial, se organizam a partir de três pontos centrais: 1º) comprometerem-se com a promoção de um alargamento metodológico, corroborando para uma atualização nas formas de compreensão da realidade. O que só será possível, caso os pesquisadores se desviem da clássica bipolarização analítica, introduzida com os estudos marxistas – caracterizados por disporem a sociedade em duas versões opostas: os dominantes e os dominados, o que de certa forma, contribuí para o ocultamento da complexidade e da diversidade dos arranjos socioculturais que se organizam em torno da religião; 2º) conferir atenção às subjetividades do outro, que aparecem atreladas às diferentes formas de espiritualidades; 3º) compreender as dinâmicas da pluralidade religiosa, atendendo às reivindicações que se apresentam por parte da sociedade, o que envolve destinar atenção às minorias étnico-raciais, de gênero etc., o que requer a capacidade de adotar uma postura de maleável e acolhedora das alteridades. (RIBEIRO, 2021)

Desse modo, as ciências da religião trata do pluralismo religioso e lida com a diversidade religiosa de forma comprometida, fomentando o diálogo inter-religioso e combatendo a intolerância, ao passo que, busca, cada vez mais, evidenciar a subjetividade do outro, que se reflete nas suas cosmovisões.

Assim, para além da conscientização acerca dos mecanismos de perpetuação da colonialidade, cabe aos cientistas da religião engajarem-se na desconstrução dessas estruturas opressoras arraigadas, desenvolvendo não só teorias e métodos alternativos para o tratamento do fenômeno religioso, como esforçando-se para confrontar fundamentalismos e promover discursos de paz e de tolerância.

 

Referências

RIBEIRO, Claudio de Oliveira. O princípio pluralista: bases teóricas, conceituais e possibilidades de aplicação. Revista de Cultura Teológica, v. 25, 2017. Disponível em: <https://www.researchgate.net/publication/323897421_O_principio_pluralista_bases_teoricas_conceituais_e_possibilidades_de_aplicacao/link/5ab1e5acaca2721710ffd15f/download>.

RIBEIRO, Claudio de Oliveira. O catolicismo brasileiro sob a ótica do princípio pluralista. Interações, vol. 16, n. 1, 2021. Disponível em: <https://www.redalyc.org/journal/3130/313066091009/313066091009.pdf>.

 

* Texto preparado para o Minicurso de Verão: O que é O Princípio Pluralista?

 

sábado, 29 de outubro de 2022

Gentileza gera gentileza

 

Já dizia o poeta das ruas

despojado do cinismo do capitalismo

 

Onde o horizonte comum se desintegra em rivalidades

O ser- participante, que se engaja num continuum de ida e volta

E habita um universo de mosaicos hiperculturais

com suas janelas do desespero moderno

e a verborragia repleta de ausências de proximidade

reconcilia a diferença que visa à sobrevivência

 

Paz perante a Guerra

sábado, 21 de agosto de 2021

 Acaba de sair publicada uma comunicação minha nos Anais do XXII Encontro Regional de História da ANPUH-MG

Pandemia e Percepção do risco  (p. 577-590)

Resumo: A humanidade enfrenta atualmente o período mais crítico de sua história recente, cujas consequências ainda são completamente imensuráveis. A percepção do risco acerca do potencial destrutivo da COVID-19 deflagra uma generalizada sensação de medo e ansiedade com relação ao futuro de indivíduos, nações e suas respectivas instituições. O dimensionamento desses riscos é feito por especialistas e divulgado pelos meios de comunicação, ao passo que é interpretado e mensurado particularmente a partir de fatores sócio culturais, onde atuam concomitantemente: o discurso médico, midiático, religioso e político. Parto de uma abordagem que articula contribuições teóricas de autores como Beck, Bauman e Giddens à uma breve análise crítica da pandemia na atualidade. Para tanto, discuto a questão da preponderância do medo e da percepção do risco, refletindo sobre os efeitos colaterais nocivos do processo de globalização. Palavras-chave: risco, globalização, pandemia.

Palavras-chave: risco, globalização, pandemia

Segue o link: ANAIS ANPUH MG 2020_Volume 1.pdf - Google Drive

https://drive.google.com/file/d/1QWx08ivPdsDuT-8b8UEqrYqwOqXZNgv7/view



Pandemia e percepção do risco[1]

Flávia Ribeiro Amaro[2]

 

Introdução

            Em um mundo caracterizado pelo seu envolvimento em uma rede de interdependência e conectividade mundial admitimos que as relações estabelecidas em âmbito global são capazes de pautar as relações locais e vice e versa. A pandemia por COVID-19 iniciada em um remoto lugarejo da China e propagada em escala planetária ressaltou a inevitável condição de imprevisibilidade das ameaças derivadas dos processos de globalização[3], elevando, assim, nossa insegurança acerca do presente, bem como, a nossa incerteza com relação ao futuro, além de evidenciar também a nossa vulnerabilidade perante uma enorme gama de perigos aos quais estamos fatalmente e desavisadamente submetidos.

Os riscos derivam da exploratória e irrefletida intervenção humana no meio ambiente e são responsáveis por causar cíclicas crises de pânico na população mundial, sendo algumas dessas crises manifestas de forma mais amena, em função de serem consideradas como razoavelmente controláveis ou circunscritas a uma determinada localidade[4], enquanto outras, manifestam-se a partir de formas mais intensas, incontroláveis e generalizadas, como é o caso da recente pandemia ocasionada pelo coronavírus.

O quadro desenhado pela pandemia deixou claro o quão desigual são as relações de poder em nossa sociedade, descortinando vulnerabilidades que estiveram presentes em nossa realidade por todo o tempo, mas que insistíamos em não dar a devida atenção. Tais desigualdades sociais foram observadas mais intensamente a partir da segunda metade do século passado, quando experimentamos um processo de urbanização acelerada, de intensificação da industrialização e do aumento do trânsito de pessoas e de mercadorias em âmbito global- implicando na configuração de um modo de vida nada sustentável e potencialmente arriscado. O desenvolvimento das forças de produção capitalistas ativou o potencial destrutivo das instituições modernas e atualmente experimentamos suas consequências de forma cada vez mais agravadas e imprecisas.

Parto do pressuposto de que os indivíduos inevitavelmente acionam aspectos culturais e ideológicos ao construírem suas concepções de medo e, simultaneamente, sua percepção de risco, bem como que, os discursos médico, midiático, religioso e político operam nesse campo, influenciando diretamente nos processos de eleição desses riscos, justamente, por fornecerem os elementos cognitivos e subjetivos que corroboram para a definição de respostas individuais frente à anseios por explicações plausíveis, o que fatalmente acaba gerando tensões e conflitos em decorrência de suas respectivas disparidades de pontos de vista. Sendo assim, os discursos não se operam a partir da simetria, eles são diversos e provocam reações das mais diferentes naturezas.

Sobre o risco

Inicialmente nos perguntamos acerca da origem do coronavírus e imediatamente nos deparamos com uma série de versões conflitantes, desencadeando assim, mais dúvidas do que respostas. Além de inúmeras hipóteses que desvelam o preconceito e a xenofobia infundados na trajetória da COVID-19. Teria sido o vírus provocado por um chinês que inadvertidamente comeu um ensopado de morcego silvestre, e tal como, a ingestão da maçã proibida da Eva bíblica tivesse a partir desse ato, lançado mau augúrios à toda humanidade? -Tal como na alegoria da caixa de Pandora, que depois de ser aberta, disseminou miríades de infortúnios, restando no fundo apenas a esperança.

Outras teorias ligam a origem do vírus letal a um mercado de peixes localizado na cidade de Wuhan na China. Grande parte das pessoas afirmam que se trata de uma conspiração comunista, alegando que a China já estava previamente preparada para pandemias e teria inoculado inescrupulosamente a COVID-19 pelos ares, segura de sua rápida recuperação econômica e determinada a dispor de algumas vidas, pois trata-se de um país populoso. Há outras hipóteses que delegam a responsabilidade por inocular o vírus na China ao exército norte-americano. No entanto, são apenas especulações do senso comum e não existe consenso.

Antes da pandemia causada pela propagação do coronavírus em dezembro de 2019, outras epidemias acometeram a humanidade, causando alarde na população mundial, no entanto, elas foram pontuais, nenhuma outra epidemia alastrou-se tão rapidamente pelo globo e alcançou proporções dessa grandeza.

O perfil dos riscos relativos a COVID-19 é mensurado por especialistas e divulgado à população através dos meios de comunicação, que em resposta ao parecer desses diversos peritos, que por sua vez, são oriundos de diferentes áreas do conhecimento, buscam alterar certos hábitos e estilos de vida, conforme sua própria interpretação e juízo, com o intuito de atender à demanda por segurança e saúde. No entanto, os modos de vida não são tão facilmente e instantaneamente alterados, e para certos grupos sociais esse processo exige ainda mais estratégias de convencimento e tempo de adaptação. Além do encaminhamento de medidas públicas pautadas pelos sistemas políticos com vistas a implementação de transformações estruturais, capazes de assegurar que esses indivíduos possam seguir as medidas restritivas mesmo à contragosto ou alheios a elas

Diferentes discursos sobre o risco

Diversas variáveis atuam nos processos de construção da percepção dos riscos por parte dos indivíduos, pois, são múltiplos os discursos em disputa e eles precisam escolher qual ou quais deles são mais efetivamente convincentes. Dentre eles, destaco como sendo os principais: o discurso médico, o midiático, o religioso e o político.

O discurso médico é caracterizado como sendo o principal sistema perito envolvido na questão das moléstias causadas pela COVID-19. Pois é ele o responsável por descrever o perfil do vírus, seus meios de contaminação, suas formas e ondas de propagação, por atualizar as informações acerca dos números de infectados e de mortos, além de fornecer as possíveis pistas para o alcance da cura através do desenvolvimento de uma vacina viável de ser produzida.

Médicos virologistas, infectologistas, epidemiologistas, sanitaristas, biólogos, biomédicos, enfermeiros, químicos e demais cientistas prometem dedicar esforços no sentido de tentar contornar a pandemia. Todavia, mesmo entre estes peritos existe confronto de opiniões, não existe entre eles unanimidade de ideias, demonstrando que a construção de evidências científicas é, também, controversa. O processo de identificação da origem do coronavírus ilustra bem essa questão. Existem defensores da teoria de que a COVID-19 assemelha-se à uma gripe, bem como, existem especialistas que afirmam tratar-se de uma doença de natureza diferente, mais grave e capaz de atacar contundentemente o funcionamento dos pulmões. Estão empenhados para o desenvolvimento da vacina, porém, ainda não existe consenso com relação à quais fórmulas seriam as mais eficazes. De forma que tal diligência ainda é incapaz de suprir o sentimento de insegurança e ansiedade presente nas pessoas.

A mídia, por sua vez, divulga exaustivamente inúmeras informações pertinentes ao assunto, que variam desde as de cunho mais sensacionalista até às de cunho mais científicas. A mídia sensacionalista explora incessantemente a questão da pandemia, destinando-a diferentes enfoques, sua abordagem exaltada pode ser considerada responsável por deflagrar e intensificar o pânico, enquanto que a mídia que se pretende informativa, empenha-se em divulgar os dados científicos, trazendo subsídios relevantes para o entendimento da situação.

As pautas midiáticas oscilam entre alertar sobre os riscos, prestando um importante serviço público de informação e exagerar na ênfase dada à determinados pontos, causando alardes tido como desnecessários. Ao alarmar as pessoas em demasia, acende um comportamento de manada que leva os indivíduos a invadirem os supermercados acabando com os estoques de álcool em gel, comida congelada e enlatada, além de papel higiênico.

No Brasil, um fato curioso foram as pessoas terem imitado o comportamento de outros países próximos da Ásia, como a Austrália, por exemplo, que levou os indivíduos a estocarem pilhas de papel higiênico antecipando uma possível crise de abastecimento em função que previa o cancelamento da exportação do papel higiênico da China. No entanto, o Brasil possui fábricas próprias do produto e provavelmente isso não ocorreria aqui.

A mídia aborda diferentes nuances do tema, que vão desde as atualizações dos boletins diários do número de novos infectados e de óbitos, passando pelo alarde acerca do agravamento da crise econômica, até, por exemplo, transmitir trechos da peculiar missa solene promulgada pelo Papa Francisco em frente a um auditório vazio em Roma. Inclusive, no Brasil, a mídia tem sido responsável por informar o número de mortes provocados pelo coronavírus, justamente, em função do Governo Federal ter ameaçado sonegar tais informações referentes aos registros obituários, deixando de apresentar dados já consolidados expostos nos boletins diários.

O discurso religioso proporciona interpretações morais e práticas relativas à vida pessoal e social, trata-se de um meio organizador da confiança, e, sobretudo, num país de acentuado sincretismo como o Brasil, manifesta-se através de diferentes vertentes interpretativas. Há aquelas denominações religiosas de caráter mais progressista que valorizam a ciência e a legitimam, e que, portanto, adotam posturas públicas no sentido de encontrar mecanismos para conscientizar a população e conter a pandemia, lançando mão de uma perspectiva pragmática da fé; enquanto há outras denominações religiosas que refutam veementemente a razão científica, valorizando uma apreensão mística do mundo, e que, consequentemente, adotam atitudes arbitrárias com relação às medidas de precaução do contágio, evidenciando o apego à uma ideia de imunização proporcionada pela fé.

Faz-se perceptível no contexto brasileiro a adoção de posturas terminantemente antagônica por parte das lideranças religiosas frente à questão da pandemia. Algumas vertentes de pronto suspenderam suas atividades religiosas, ora se adaptando e intensificando os cultos transmitidos televisivamente ou virtualmente, ora se recolhendo na intimidade da fé individual; enquanto outras vertentes religiosas, cujo apego à uma concepção de pretensa imunização propiciada pela fé, levou-os a continuar realizando seus encontros litúrgicos, que tiveram, inclusive, que ser fechadas pela guarda civil por desobedecerem a ordem de governadores estaduais que proibiram a realização desses cultos e demais reuniões públicas como medida para evitar a aglomeração e impedir a transmissão do vírus.

Certas religiões adotaram uma perspectiva mítica frente ao risco que delega seu poder de concretização aos desígnios divinos. De maneira que creem que o mal, ou seja, o risco de contração da Covid-19, só poderia se manifestar caso houvesse uma punição divina, e essa, por sua vez, estaria condicionada ao arbítrio individual de ferir ou não os princípios teológicos do que é considerado bem e mal. Dentro desse viés de interpretação, segundo suas concepções bastaria o indivíduo não pecar e preferir rotineiramente a bondade em detrimento da maldade, que o risco de adoecer em função do coronavírus não encontraria espaço para manifestação.

Nossas noções de saúde e doença são influenciadas também por mecanismos conhecidos pelos antropólogos como “pensamento mágico”. Desde os primórdios da ciência antropológica o pensamento mágico era atribuído às sociedades ditas primitivas ou exóticas, hoje entende-se que esse pensamento está igualmente difundido na sociedade contemporânea. O discurso religioso atua diretamente na construção do pensamento mágico, influenciando na criação da percepção do risco, haja visto que, o medo do contágio está enraizado em sua estrutura elementar e em seu pensamento simbólico.

O discurso político, mais do que qualquer outro discurso se mostra completamente desconexo. Em pronunciamento oficial o presidente da república convocou as pessoas a retomarem seus postos de trabalho, bem como, deliberou a volta da realização de cultos religiosos, porém, alguns governos estaduais discordaram dessas determinações do presidente e se prontificaram a manter o regime de quarentena em seus respectivos estados.

E por que existe tamanha disparidade entre os discursos disseminados entre a população sobre a COVID-19? Por que a avaliação dos riscos por parte dos experts acaba se tornando incompatível com a interpretação corrente no senso comum?

Para tentar explicar essas questões talvez seja interessante ressaltar que a construção da percepção do risco não se efetiva da mesma maneira entre todas as pessoas, pois não são geradas da mesma forma e não resultam dos mesmos mecanismos mentais.

A percepção do risco eminente de contágio pelo coronavírus é, portanto, diretamente ligada a fatores tanto subjetivos e cognitivos - de ordem individual, quanto a fatores objetivos e exteriores - de ordem sócio cultural. O medo do contágio é intrínseco ao pensamento crítico e simultaneamente mágico. Está arraigado na mente humana e nas cosmovisões, que por sua vez, são frutos da bagagem cultural dos indivíduos. Dessa forma, o que é considerado risco para uns, pode não o ser para outros.

O risco induz ao medo e ao ultraje. Cada indivíduo recorre, portanto, às explicações que melhor lhe convém. Aquelas pessoas acostumadas à valorizar a ciência e a privilegiar noções pautadas pela razão, naturalmente estão se prevenindo da melhor maneira possível, enquanto aqueles indivíduos que se deixam levar por manipulações ideológicas e não buscam por si só fontes idôneas de informação, entregam-se inevitavelmente à condição de massa de manobra política, e inadvertidamente estão pouco preocupados em manter as medidas de confinamento. Esses indivíduos irrefletidamente lançam-se no risco, sem ao menos protestar artifícios críticos e autônomos para dimensionar seu alcance.

Na concepção do senso comum um risco próximo sofrido por entes conhecidos ou familiares pode ser melhor representado e mais vividamente imaginado, gerando assim, mais medo e tensão, diferentemente de um risco distante e abstrato. Quando a morte alcança alguém que o indivíduo trate por você, ou seja, que apresente laços biográficos de interligação, definitivamente o risco atinge em seu imaginário o status de veracidade, irrefutabilidade e irrevogabilidade. Nessa perspectiva, quanto mais o vírus se avizinhar dos indivíduos, progressivamente se irá notar um crescimento da percepção do risco.

Outro fator relevante que justifica a presença de um contingente significativo de pessoas circulando pelas ruas é o fato de o risco apresentar caráter deliberativo. Isso significa que, cabe exclusivamente ao indivíduo mensurar suas variantes e decidir se pretende ou não se expor a este determinado risco.

Em nossa sociedade globalizada e interdependente, necessitamos uns dos outros para mantê-la em funcionamento. O modelo cartesiano implicou que nós nos especializássemos cada vez mais em funções específicas, formando, assim, sistemas abstratos responsáveis por portar e administrar um conhecimento particular. E que, acionássemos outros especialistas quando precisássemos de seus respectivos produtos e serviços. No que envolve a questão do combate ao vírus, apenas aqueles profissionais alocados na linha de frente da ação, em geral, os médicos, enfermeiros, maqueiros, motoristas de ambulância, faxineiros, coveiros, entre outros, poderiam fornecer com mais propriedade informações sobre a dinâmica da pandemia. Bem como, apenas virologistas e epidemiologistas poderiam fornecer pistas precisas acerca do comportamento microbiológico do vírus. Não somos especialistas em COVID-19, precisamos confiar no que atestam os peritos da área. De maneira que todo o cenário desenhado pela pandemia demanda a confiança em sistemas abstratos- presentes desde os processos de rastreamento das origens do vírus, passando pelo sequenciamento de sua cadeia de DNA, pela busca da fórmula da vacina, pelo conhecimento acerca da assepsia necessária, pela tecnologia dos respiradores, pelo tratamento aos infectados, entre outras.

Precisamos seguir as prescrições das autoridades em saúde pública, que basicamente giram em torno de permanecer em isolamento social e caso seja inevitável o contato com a rua, que sejam tomadas, assim, medidas de higiene redobradas. Segundo atestam grande parte dos especialistas, somente seguindo essas orientações para a contenção do vírus poderemos conjuntamente achatar a curva de contágio e, assim, favorecer o sistema de saúde nacional no sentido de evitar o congestionamento das unidades de pronto atendimento, enquanto a solução efetiva não é encontrada.

Vale ressaltar que o padrão de previsibilidade dos especialistas sugere que o pânico desencadeado pelo medo de contaminação por coronavírus apresente certo caráter de efemeridade, pois assim como aconteceu com outros eventos do passado, este também será supostamente contornado ou esquecido. De forma que, os pânicos vêm e vão, e este atual provavelmente seguirá a mesma trajetória, será superado e inevitavelmente substituído por outro futuramente. Este ininterrupto movimento de sucessão de riscos pode ser considerado como revelador dos limites da atuação humana frente ao meio ambiente, que através do dimensionamento dos danos causados em seus processos exploratórios, acaba despertando uma consciência reflexiva capaz de rever sua própria postura. Tal como coloca Bauman:

 

“A vida líquida flui ou se arrasta de um desafio para outro e de um episódio para outro, e o hábito comum dos desafios e episódios é a sua tendência a terem vida curta. Pode-se presumir o mesmo em relação à expectativa de vida dos medos que atualmente afligem as nossas esperanças. Além disso, muitos medos entram em nossa vida juntamente com os remédios sobre os quais muitas vezes você ouviu falar antes de ser atemorizado pelos males que esses prometem remediar.” (BAUMAN:2008, p.14)

 

O dialético processo de construção e reconstrução dos hábitos sociais em função da consciência reflexiva acerca do impacto potencialmente incapacitante dos medos gerados pelos riscos produzidos pela sociedade contemporânea são inerentes à nossa estrutura social. Isso significa que, no caso do coronavírus, enquanto não for encontrada a fórmula eficaz para seu controle, permaneceremos em pânico e nutrindo o sentimento de medo e insegurança frente as relações sociais desencadeadas face a face. Exploraremos cada vez mais mecanismos de exercer uma comunicação virtual, e institucionalmente mudanças serão incorporadas à curto e médio prazo. É previsível também, que grande parcela da população não sustente o isolamento por muito tempo e acabe afrouxando as medidas de contenção, de maneira que, se o risco não for resolvido, ele será esquecido.

Extensionalidade e temporalidade dos riscos

Os efeitos da intervenção humana sob a natureza não são necessariamente intencionais, pode-se afirmar que em sua maior parte são resultado de ações inconsequentes, mal planejadas ou arbitrárias - são, portanto, relativamente inesperados, pois em detrimento dos cálculos de previsibilidade dos especialistas, podem originar-se de inusitadas situações, que fogem ao controle humano.

Nem todas as nuances das consequências indesejáveis provocadas pelo homem são presumíveis. Percebemos que o fato de serem passíveis de serem calculadas, não corresponde necessariamente à possibilidade de total previsibilidade. Conforme explicita Bauman na citação a seguir:

“Mesma que calculada com seriedade, a probabilidade não oferece a certeza de que os perigos serão ou não evitados neste caso particular, aqui e agora, ou naquele caso, em outro lugar e momento. Mas pelo menos o próprio fato de termos feito nosso cálculo de probabilidades (e portanto por implicação evitarmos decisões precipitadas e a acusação de irresponsabilidade) pode nos dar a coragem de decidir se o resultado justifica o esforço, além de oferecer certo grau de confiança, ainda que sem garantia.” (BAUMAN: 2008, p. 18 e 19)

            Ou seja, os cálculos probabilísticos podem fornecer um panorama da aceleração do processo de disseminação do vírus, mas não podem garantir que o combate à pandemia seja realmente levado à cabo e, portanto, que os dados comportem-se necessariamente como o esperado, pois não podem certificar-se que os governantes dos países dispostos pelo globo adotem as medidas apontadas pelos peritos, nem tampouco que essas medidas sejam verdadeiramente eficazes. Beck coloca que é preciso reconhecer a ambivalência da questão de risco, pois, segundo sua concepção: “É sua ambivalência fundamental que distingue os problemas de risco dos problemas de ordem, que por definição estão voltados para a clareza e a faculdade de decisão.” (BECK:1997, p. 20)

Os dados estatísticos tornam-se mais evidentes no âmbito da matemática e configuram-se enquanto apenas mais um artifício de informação disponibilizado por um sistema perito à serviço do controle da pandemia. Sabe-se, por exemplo, que existe uma exorbitante quantidade de casos de contaminação pela COVID-19 subnotificados no Brasil, e estes números inclusive, são hipoteticamente calculados e previstos. Entretanto, para evitar que tais previsões estatísticas caiam em descrédito e se tornem inúteis, é importante que governos e populações as legitimem e que as utilize no sentido de orientar suas condutas. É preciso que eles creiam na eficácia da ciência estatística e consequentemente sigam as determinações veiculadas pela Organização Mundial de Saúde que preveem seu comportamento. Destarte, faz-se imperativo que tanto as políticas públicas dos países, quanto a população admitam que a possibilidade de contaminação pela COVID-19 espreite suas vidas por debaixo da carapaça camuflada da impossibilidade, aguardando apenas a ocasião mais oportuna para irromper.

            A ciência e a racionalidade, com efeito, alcançaram e forneceram o tão aspirado status de segurança, em comparação a períodos históricos anteriores fadados à contingência, no entanto, a atual pandemia, revela que essa segurança é terminantemente limitada, pois não se trata de uma conquista humana universal. A pandemia apresenta assim certo caráter eletivo, pois não atinge culpados e inocentes, ricos e pobres, asiáticos, europeus, estadunidenses e latino americanos com a mesma equanimidade. No entanto, nem todos os indivíduos e suas respectivas nações dispõem dos mesmos recursos para combater a contaminação por covid-19.

Certos problemas como a falta de moradias, ou a existência de moradias erigidas em condições insalubres, a falta de educação escolar e de informações fidedignas, a carência de recursos financeiros para manter a quarentena, entre outras circunstâncias, como o sucateamento de hospitais e suas superlotações, denotam o quão desigual são os nossos recursos sociais para o combate da pandemia. Uns estão mais potencialmente seguros, em detrimento de outros que estão completamente expostos aos riscos, e não cabe a esse contingente de pessoas outra escolha.

É fato de que nos tornamos cada vez mais dependentes de sistemas complexos de conhecimento e informação para sustentar a vida em sociedade. As cidades, por exemplo, são lugares que nos tornam vulneráveis à contaminação, vivemos muito próximos uns dos outros, dependemos demasiadamente uns dos outros, e, agora mais do que nunca essa condição coloca em xeque nossa própria existência.

Beck e Giddens centraram a sua atenção nos aspectos macroestruturais das organizações político econômicas das sociedades contemporâneas, bem como suas implicações nas condutas de vida das pessoas em suas respectivas ações cotidianas. Os autores localizaram a causa principal da ansiedade em torno das questões envolvendo a saúde, e do sentimento de insegurança frente à relação com o meio ambiente como sendo resultado dos efeitos colaterais nocivos do processo de globalização.

Para Ulrich Beck a sociedade de risco origina-se na sociedade industrial, que no final do século XX inaugurava uma fase histórica da humanidade, na qual se reconhece que as soluções organizacionais ao passo que geram melhores condições de vida e aumentam o conforto e a expectativa etária, também suscitam consequências negativas. Exemplo disso é o caso da proliferação de um vírus letal à nível continental que estamos vivenciando agora. Na perspectiva do autor, uma parte substancial dos riscos escapou do controle do sistema convencional da modernidade. Os Estados não conseguem mais regular os riscos de alta complexidade, como é o caso da pandemia causada pela COVID-19, que extrapolou as fronteiras geopolíticas da China e alcançaram quase todos os recantos do globo.

A humanidade lida agora com os agravantes da sua competência para a autodestruição, seja de maneira proposital ou em função de uma possível falha no manejo de elementos e situações potencialmente destrutivos. A noção da ameaça de auto aniquilamento é indispensável para que se adie ao máximo a possibilidade de auto extinção, pois é justamente o medo do perigo que impulsiona a prevenção das faltas.

O caráter da vulnerabilidade que experimentamos atualmente é proveniente dessa densa rede de conectividade a qual estamos irrevogavelmente atados, da mesma forma que obedece à princípios de natureza ética e política que colocam em interdependência não apenas os acertos, mas também as falhas.

A maneira como as informações chegam ou não ao senso comum. E como este senso comum as interpreta, fornece os mecanismos para a definição de categorias de sujeitos frente à pandemia. Quem sabe sobre o vírus, bem como o grau de conhecimento acerca dele, e as fontes que foram privilegiadas para a obtenção de tais informações definem a postura dos indivíduos perante o vírus. Conforme coloca Bauman:

“O espectro da vulnerabilidade paira sobre o planeta “negativamente globalizado”. Estamos todos em perigo, e todos somos perigosos uns para os outros. Há apenas três papéis a desempenhar- perpetradores, vítimas e “baixas colaterais”.” (BAUMAN: 2008, p. 128)

 

Ou seja, conforme os indivíduos interpretam a eminência do risco de contaminação pela covid-19 e preparam suas vidas cotidianas em sua função, apresentam indícios de que categoria descrita por Bauman estariam inseridos. O fato de terem optado consciente ou inconscientemente por serem: “perpetradores” do vírus, “vítimas” dele ou “baixas colaterais” do sistema - resulta nas posturas pessoais frente à tomada de decisão individual de cumprir ou não as recomendações de saúde estabelecidas pelos peritos, no caso biomédicos e virologistas.

É importante ressaltar que países que adotaram medidas restritivas e se comprometeram com o “lockdown” apresentaram melhores índices de prevenção à COVID-19. Enquanto, aqueles países que não adotaram de pronto políticas públicas que forçassem o isolamento social, como é o caso da Itália, por exemplo, apresentaram maiores índices de contaminação.

            A situação atual revela que o anúncio da pandemia não resultou em mudança de atitude por uma parcela considerável da população brasileira. Mesmo tendo sido exaustivamente informados através dos meios de comunicação, que por sua vez, traduziram o parecer dos especialistas sobre a questão, algumas pessoas preferem dar ouvidos à discursos religiosos e/ou político-ideológicos negacionistas, rechaçando veementemente as circunstâncias e recusando-se a adotar as medidas de contenção. O resultado mostra que o maior obstáculo enfrentado pelas autoridades sanitárias para o controle  do coronavírus no Brasil hoje é a incredulidade com relação à sua contração, ou do potencial destrutivo de sua atuação no organismo - tal postura, inclusive é incentivada por determinadas denominações religiosas e lideranças políticas, e endossadas até mesmo pelo próprio presidente da república.

Considerações finais

            Definitivamente chegamos a um momento crítico da história mundial, capaz de demonstrar claramente a vulnerabilidade da nossa condição humana e de como é limitada a nossa capacidade de emergir incólumes frente as perdas provocadas pela pandemia do coronavírus. Vivenciamos atualmente a experiencia terrificante de populações heterônimas, extremamente vulneráveis à um risco pandêmico que nos coloca na condição de indenfensabilidade e cuja segurança não pode ser obtida instantaneamente, tampouco, garantida de maneira confiável. Entramos em um período de crise generalizada e sem precedentes, beirando a um colapso social e econômico.  Por enquanto não dispomos de certezas, nem temos noção de como manejaremos os danos causados daqui para frente. Finalmente estamos começando a entender que as consequências da modernidade foram longe demais e que elas se apresentam agora significativamente exacerbadas, sendo ainda mais radicais e universalizadas que antes.

Depois que a poeira viral literalmente “baixa”r, e ela assim o fará muito provavelmente, seja mais cedo ou mais tarde - porque na história os pânicos vêm e vão, eles são efêmeros e se alternam ininterruptamente desde que mundo é mundo. Nós vamos nos reinventar, porque somos seres criativos e plásticos, vamos nos forjar em novas configurações. De forma que, depois que o problema da proliferação pela COVID-19 for superado, teremos que rever nosso modo de vida e por conseguinte aprender a lidar com um processo de reconstrução da confiança. Devemos reinventar a confiança na eficácia da (s) ciência(s), assim como em seus protocolos de prática científica, nas nossas instituições sociais, na idoneidade e boa intenção dos nossos líderes políticos, bem como, na proficiência do sistema governamental, teremos que voltar a estabelecer a confiança em nossas relações sociais.

Em suma, teremos que reiventar nossas formas de conceber o mundo, e isso sem perder de vista a ameaça eminente de auto aniquilamento da humanidade. De forma que dificilmente nos livraremos da percepção de risco e dos medos por ele desencadeados, estaremos sempre lutando contra o impacto potencialmente incapacitante do medo, não só de contração de um vírus letal que resulta em pandemia, mas também de tantos outros vírus que supostamente o seguirão, além de outros perigos pouco estimados ou desconhecidos.

É previsível que esta crise desencadeada pela pandemia da COVID-19 perdure tempo suficiente para causar danos irreversíveis e ainda totalmente imprevisíveis em nossas instituições em vigência, que a cada dia são obrigadas a lidar com questões cada vez mais complexas. O futuro se apresenta como sempre o foi - aberto, repleto de riscos, pautado pelas incertezas e pelo sentimento de medo e ansiedade que delas decorrem, de forma que, continuaremos assim, a recorrer a estratégias e expedientes que nos permitam afastar mesmo que limitadamente a iminência dos perigos. À vista disso a administração das crises tornar-se-á cada vez mais difícil, e não sabemos por hora qual delas será irremediavelmente inadministrável.

Referências bibliográficas

BAUMAN, Zygmunt. Medo líquido; tradução Carlos Alberto Medeiros. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2008.

BECK, Ulrich. Modernização reflexiva: política, tradição e estética na ordem social moderna/ Ulrich Beck, Anthony Giddens, Scott Lash; tradução de Magda Lopes. São Paulo: Editora da Universidade Estadual Paulista, 1997.

GIDDENS, Anthony. As consequências da modernidade.; tradução Raul Fiker. São Paulo: Editora UNESP, 1991.

LAPASSADE, Georges. As microssociologias; tradução de Lucie Didio. Brasília; Editora: Liber Livro, 2005.

 



[1] Proposta de comunicação para o Simpósio Temático de nº 10: “História da saúde e das doenças: perspectivas historiográficas e implicações culturais e sociais” do XXI Encontro regional de História da ANPUH MG 2020.

 

[2] Doutoranda no programa de Pós-graduação em Ciência da Religião, do Instituto de Ciências Humanas da Universidade Federal de Juiz de Fora, Minas Gerais, Brasil. E-mail para contato: flavia.ramaro@gmail.com.

 

[3] Segundo Giddens: “A globalização pode assim ser definida como a intensificação das relações sociais em escala mundial, que ligam localidades distantes de tal maneira que acontecimentos locais são modelados por eventos ocorrendo a muitas milhas de distância e vice-versa. Este é um processo dialético porque tais acontecimentos locais podem se deslocar numa direção inversa às relações muito distanciadas que os modelam.” (GIDDENS: 1991, p. 69)

 

[4] Como foi o caso da SARS em 2013, por exemplo.

 

quarta-feira, 18 de agosto de 2021

 

A eterna dança cósmica do caos

 

O grande engodo previa o adormecimento das forças antagônicas do caos. De um lado estavam os neoliberalistas crentes na eficácia do sistema capitalista de produção, estes cantavam aos sete ventos as supostas benesses da tecnologia e a capacidade de uma ilusória e maleável acumulação do capital. Defendiam que para manter-se no poder seria necessário destituir antigas políticas assistencialistas e o intervencionismo estatal. De outro lado estavam os críticos dessa visão, pautados por ideais marxistas e libertários, condenando a superprodução, a substituição do trabalho humano pelas máquinas e a acumulação de capital fictício. A crise por tantos anos adiada, chegou finalmente às vias de fato. O apocalipse é agora.

O EUA entrou em derrocada, seu déficit comercial atingiu cifras extraordinárias. Com Bretton Woods surgem as moedas sem lastros vagando em trânsitos flutuantes, em decorrência vem a globalização que permite que bancos e empresas operem simultaneamente utilizando várias moedas. Agora surge as criptomoedas e todo esse sistema abstrato atinge novas configurações.

Era previsível que mais cedo ou mais tarde essa hegemonia norte- americana caísse por terra, pois os EUA havia passado a emitir dólares à revelia. Outros países não aceitariam essa posição subordinada eternamente, a dança cósmica do caos inevitavelmente alternaria a posição dos pares e de quem está ao centro da roda. Os yankees eram tolerados porque eram donos da se a jukebox, porque sua hegemonia estava inscrita na própria lógica de funcionamento do sistema, pois eram eles quem tocavam a música. Por isso havia a cooperação, o dólar precisava se sustentar para sustentar outras economias. As novas roupagens da guerra que se evidencia denunciam que o conflito de cooperação aponta para uma crise sistêmica iminente. A cacofonia representa um inflexão na conjuntura internacional, China, Rússia e porque não Afeganistão denunciam uma multipolaridade de poderes.

 

 

terça-feira, 17 de agosto de 2021

 

Na eterna dança cósmica do caos

ora as sombras acendem, ora as luzes se apagam

O deus da guerra clama por refeições mais fartas

O apocalipse é Now, enquanto se assiste ao jornal nacional

O astrólogo professou a queda do dólar

Enquanto despencam vidas

que abandonam o corpo antes do impacto

confinamento de formigueiro

e a sensação do boi a caminho do abate

segunda-feira, 24 de maio de 2021

Despropósitos, transtornos irremissíveis e inconveniências

Se não há propósito
Isso se deve ao fato 
de que o que havia 
de mais supostamente sólido, 
se dissolveu 

Mas, antes tivesse se extinguido 
dissolveu,
deixando marcas indeléveis 
como nódoas na epiderme da alma 

vítima quando se cala 
se enterra viva 
vítima não tem que ter vergonha 
de ter sido vítima 
num teatro de narcisistas 

cismas drásticas 
a libertação vem com a denúncia? 
a cura, vem pela fala? 


Descontinuidades e rupturas

Não, São Paulo não me cativou nesse ano. Para mim, privilégio não é estar onde “todo mundo está”, mas estar em um lugar onde se pode, num ...